André,
o irmão de Pedro, era excepcional em todos os sentidos. Diferente de seu irmão,
não era falastrão – nunca lemos relatos diretos de suas palavras em nenhum dos
evangelhos nem no livro de Atos – nem agia de forma precipitada como àquele.
Ele
era um membro do grupo mais íntimo entre os doze, pertencendo ao mesmo grupo
que seu Pedro. Contudo, mesmo pertencendo a este grupo, ele não é incluído nos
relatos de acontecimentos cruciais, como alguns dos quais são citadas as
presenças de Pedro, Tiago e João (Mt 17.1; Mc 5.37; 14.33). Ainda assim, ele
possuía um relacionamento íntimo com Jesus e apresentou muitas pessoas
diretamente ao Mestre.
Pedro
e André eram naturais de Betsaida (Jo 1.44), vila próxima de Cafarnaum, para
onde foram quando já eram pescadores profissionais a fim de conduzirem seu
próprio negócio[3].
Lá, moravam próximos de Tiago e João, seus possíveis amigos de infância e que
também eram pescadores. Os quatro, apesar de ainda não terem encontrado a Jesus
pessoalmente, eram já altamente interessados em manter uma regularidade na vida
Espiritual. Prova disso é que eles viram a Jesus pessoalmente quando ainda eram
discípulos de João Batista (Jo 1.35-42), no deserto. Esse, provavelmente foi o
momento em que eles haviam tirado o ano sabático, previsto na Lei de Moisés,
para finalidade de dedicarem-se integralmente à YHWH[4]. Apesar disso, André, era
extremamente diferente de seu irmão em seus atos e em suas características
pessoais.
1 – O DISCÍPULO “MENOS CONHECIDO” DE SEU
GRUPO
Desse
grupo mais íntimo e pessoal do Senhor Jesus, André, sem sombra de dúvidas, era
o menos conhecido deles. As poucas vezes em que seu nome é citado é procedido
da informação de que ele era irmão de Pedro, como se essa informação fosse a
importância ou destaque que lhe era conferido.
Enquanto
os demais de seu grupo tinham um destaque maior, o seu nome aparece apenas nove
vezes no novo testamento (afora a listagem com o nome dos doze) e a maioria
dessas vezes ele é apenas mencionado. Ele estava pronto para exercer um
ministério nos bastidores, pois nenhum texto o destaca diretamente em atos e
feitos que, diríamos, ter sido extraordinários. Mas isso não fê-lo menor,
embora ele seja bem menos conhecido do que seu irmão. Enquanto Pedro era
eloquente e falava demais, André era mais calado e apenas testemunhava.
Enquanto Pedro era cheio de atitudes, André era mais quieto e seus atos eram
menos chamativos aos olhos dos demais, mas era igualmente útil ao Senhor,
principalmente quando, junto dos demais, herdou a missão de propalar as boas
novas de salvação (At 1.8).
2 – ELE ENXERGAVA O VALOR DAS PESSOAS COMO
INDÍVIDUOS.
O
primeiro relato que as Escrituras fazem de André definem bem suas
características pessoais, como também as características de seu ministério. Ao
ouvir falar de Jesus e conhecê-lo, ele foi imediatamente à Simão, seu irmão, a
fim de que este conhecesse a Jesus pessoalmente.
O
evangelho de João nos mostra como foi sua conversão. Ele, junto o discípulo não
identificado – a Igreja, desde os dias “dos pais da Igreja”, aceita a
identificação de que o autor do evangelho e o discípulo apenas identificado
como “aquele a quem Jesus amava” eram a mesma pessoa[5]. Logo, o discípulo que
estava com André era o próprio João – estavam ouvindo os ensinos de João
Batista, primo de Jesus a respeito do verdadeiro Messias, quando viram-no
apontar ao Mestre e lhes dizer: “Eis o cordeiro de Deus que tira o pecado do
mundo” (Jo 1.29). No dia seguinte, João repete seu testemunho e eles vão atrás
de Jesus para aprenderem Dele. Quando passam a tarde e a noite em comunhão e
aprendizado com Jesus, reconhecem ser ele o verdadeiro Messias (Jo 1.29-39). A
partir daquele instante, a primeira coisa que Ele fez não foi terminar as
coisas de sua vida, não foi aproveitar ao máximo suas forças e apenas
frequentar as reuniões onde Jesus ensinava, muito menos foi primeiro preparado
teologicamente para poder ensinar. Muito menos esperou que colocassem sobre ele
as mãos ou que lhe dessem algum cargo de importância entre o grupo de
seguidores do Messias[6]. O texto deixa claro que,
ao reconhecer que aquele homem era verdadeiramente Jesus, ele foi imediatamente
chamar a Pedro e apresentou o Cristo primeiramente a seu irmão para que ele
também conhecesse, reconhecesse e seguisse àquele que era o cumprimento das
profecias veterotestamentárias. Essa era a marca do ministério pessoal de
André.
André,
a semelhança de Pedro, Tiago e João, também fora chamado por Jesus para ser
pescador de homens (Lc 5.1-11). E ele dedicou-se integralmente para cumprir com
esse chamado longe dos holofotes. Ele não levou grandes multidões duma vez ao
pleno conhecimento de Cristo, como Pedro em suas pregações registradas em Atos
(At 2.14-41; 3.11-26). Mas “apreciava
plenamente o valor de uma alma[7]”,
fosse para conhecer pessoalmente a Jesus, fosse para explorar a ajuda que cada
indivíduo tinha para contribuir com a obra. Lembremos de que fora André quem
apresentou um menino a Jesus com a finalidade de alimentar a multidão quando da
multiplicação de pães e peixes (Jo 6.9).
André
não pensava duas vezes antes de apresentar alguém a Jesus. João 12.20-22 no
fala que alguns gregos ouviram falar do Mestre e quiseram conhece-lo, indo até
Filipe. Isso era significativo. Mas o fato de Filipe conduzi-los até André era
tão importante e surpreendente quanto. André era a pessoa certa para levar
“desconhecidos” à presença de Jesus. Ele sabia como fazê-lo de modo natural e
sabia que Jesus nutria interesse pessoal nessa situação específica. Ele não
ficava confuso ou perdido nessas situações. Ele foi o primeiro missionário em
sua casa, ao levar Pedro até Jesus e foi o primeiro missionário transcultural,
pois levou os gregos, i.é., gentios ao Senhor.
Tanto
Pedro quanto ele tinham ardor pela pregação da palavra e anuncio sobre o reino
de Cristo. Contudo, enquanto Pedro fora chamado para as multidões, André fora
chamado aos indivíduos. E isso não era menos importante. Lembremos de que foi
André quem apresentou Jesus a Pedro. Portanto, todo e qualquer fruto do
ministério Petrino, arrastando multidões, era, indiretamente, frutos do ardor
de André. O pregador de multidões, que foi instrumento na conversão de quase 5
mil pessoas em dois discursos apenas, foi evangelizado individualmente pelo
simples pregador de pequenas quantidades: André.
3 – ELE ENXERGAVA O VALOR DAS DÁDIVAS
INSIGNIFICANTES.
Muitas
pessoas se perdem por não conseguirem apreciar os pequenos detalhes e de não
saber administrar os poucos recursos como sendo os mais preciosos nas mãos do
Senhor. André era o oposto desta descrição por ser o homem que via não apenas o
valor das pessoas individualmente, mas, também, por explorar os parcos recursos
sabendo que, nas mãos de Cristo, se tornariam exatamente aquilo que precisavam.
No
relato da multiplicação de pães e peixes registrada por João (Jo 6.1-15) temos
exatamente uma situação como esta. Jesus havia se retirado para um monte a fim
de orar e descansar da multidão aflita que o seguia para aprenderem de suas
palavras. De algum modo não descrito nos relatos dos evangelistas, uma multidão
descobriu onde ele estava e foram até ele a fim de ouvirem-no novamente. Jesus,
que iria usar “pão” como ilustração do seu sermão sobre si mesmo e, também,
alimentar a multidão de forma física, ordenou aos discípulos que comprassem
pão. Os discípulos estavam apenas com duzentos denários, que não dava para
alimentar toda aquela imensa multidão de quase cinco mil pessoas. Sabedores de
que aquilo seria impossível, começam a indagar como e onde iriam, aquela
altura, arrumar os pães que Jesus pedira. André foi aquele que anunciou, apesar
de saber dos parcos recursos em mãos, que havia um menino de posse de cinco
pães e dois peixinhos.
A
ordem era clara: Eles tinham de alimentar aquela multidão. André sabia que
Jesus jamais daria uma ordem daquelas sem que fosse possível torna-la real. Por
isso, fez o que sabia fazer: levou o menino aos pés de Jesus para que este o
conhecesse e operasse seu poder com os recursos que havia. Este discípulo havia
compreendido mui claramente que poucos recursos podem tornar-se todo suficiente
nas mãos do Senhor. Com aqueles cinco pães e dois peixes, a multidão fora
alimentara e ainda sobraram. Ele aprendeu que não importa a quantidade existente,
mas sim o desejo de servir ao Senhor com o melhor do que se possui e o Senhor
opera maravilhas com esses recursos. Nenhuma dádiva é insignificante nas mãos
de Deus.
Jesus
ensinou essa realidade aos discípulos quando falou da oferta da viúva pobre. Jesus
não necessitava de nenhum daqueles elementos para manifestar seu poder ou para
alimentar aquela multidão. No Antigo testamento[8], o Senhor já havia
manifesto tal ação e poder quando fez cair maná do céu para alimentar o povo de
forma que, durante a peregrinação no deserto, jamais faltou pão (Dt 2.7), ou
quando alimentou o profeta Elias e a viúva de sarepta com pouquíssimos recursos
(1Rs 17.8-16). Fazê-lo naquele instante o mesmo feito, lhe era fácil. Mas o
Senhor “toma as dádivas sacrificiais e
insignificantes das pessoas que contribuem fielmente e as multiplica[9]”
e delas ou com elas faz coisas extraordinárias.
4 – ELE ENXERGAVA O VALOR DO SERVIÇO
DISCRETO.
Como
já dito, André não ficava em evidência, nos holofotes, como seu irmão Pedro.
Diferente deste e de seus amigos Tiago e João, André não fazia questão de estar
em evidência e nem ficava preso em discussões vazias como quem seria o
primeiro, mais importante ou quem se assentaria ao lodo de Jesus quando da
manifestação de Seu Reino. As passagens neotestamentárias que o destacam,
sempre dizem que ele estava levando alguém até Jesus. E, para ele, isso era o
mais importante.
Longe
de qualquer pretensão de sua parte, ele nunca quis ficar em evidência. Atos,
que conta a história dos apóstolos depois da ascensão de Jesus, não o cita,
exceto quando antes do pentecostes. Não há nenhuma carta escrita por ele,
nenhuma igreja diretamente fundada por ele da qual tenhamos ciência. Mas isso
não diminuiu o Seu valor diante de Deus.
Tanto
quanto seu irmão Pedro, foi um homem usado por Deus e um privilegiado: Foi o
primeiro a ouvir o testemunho de João Batista sobre Jesus; foi o primeiro a
seguir o Cristo; foi o primeiro a levar alguém até Jesus; fez parte do grupo
mais íntimo do Salvador; seu nome, assim como os demais, será gravado nas
fundações da cidade santa. Seu serviço pouco visto o tornou o que, de fato, ele
era: um instrumento usado pelo Senhor.
5 – SUA MORTE.
Conta-nos
a história de que ele morreu, como os seus companheiros, perseguido por causa
do nome do Senhor. A Tradição nos conta que ele foi pregar o evangelho no norte
(por isso é o padroeiro da Escócia e esse país leva a cruz que recebeu seu
nome, como símbolo de sua bandeira). Lá, pregou para a esposa de um governador
provincial romano que exigiu o abandono fé que, agora, ela professava. Ao
recusar fazê-lo, seu esposo ordenou a morte de André.
Como
prêmio por sua fidelidade ao Senhor, teve o privilégio de padecer e morrer por
Cristo. Conta-nos a história de que ele foi levado a uma cruz em forma de “x” e
lá ficou pendurado durante dois dias, pois não foi pregado e sim amarrado a ela
para que sofresse mais, como castigo do imperador por pregar a fé em Jesus.
Seus
seguidores da época, segundo Eusébio, grande historiador cristão da
antiguidade, relataram que ele não temeu a morte, nem titubeou diante dela. Ao
contrário, contaram que quando ele a viu, disse: “Muito desejei e esperei por esta
hora. A cruz foi consagrada pelo corpo de Cristo pendurado nela[10]”. Preso a ela, enquanto ainda não havia
expirado, continuou pregando o arrependimento e a fé em Jesus para a salvação,
aos seus algozes e a todos quantos o viram e ouviram. Como em vida, sendo
participante das ações de Cristo, na morte foi participante de seu sofrimento
para, na ressurreição, ser participante de Sua glória.
CONCLUSÃO
André foi um discípulo peculiar. Não estava
preocupado em arrastar grandes multidões ou em fazer coisas grandiosas. Sua
preocupação era levar pessoas, o máximo que pudesse pregando individualmente,
ao conhecimento do Redentor. Tinha plena consciência daquilo que Paulo
exortara, anos depois, a Igreja de Corinto ao lembrar que “no Senhor, o vosso trabalho não é vão” (1Co 15.58). Ele não
precisava aparecer, desde que a glória de Cristo aparecesse.
Ele também não se preocupava com os recursos.
Aprendeu que não poderia se guiar pelas probabilidades ou pelo o que seus olhos
podiam ver. Na prática, fez o mesmo que Habacuque ao confiar em Deus mesmo
contra as possibilidades diante de seus olhos (Hc 3.17-19). Se Deus
manifestasse o Seu poder, tudo seria possível (Lc 1.37).
APLICAÇÃO.
Existem pessoas que não gostam de estar na linha
de frente e agem muito bem pelos bastidores. Porém, existem pessoas que ainda
são guiadas pelo – maligno – desejo pelos holofotes e que só dedicam-se ao
trabalho se seus nomes estiverem em evidência e se forem destacadas de alguma
forma. A lição de hoje nos ensina que a importância está no trabalho e não na
quantidade ou no destaque dele.
Existem pessoas que não ficam em evidência nunca
e que, talvez, jamais ouçamos falar a seu respeito. Existem pregadores que são
fiéis ao Senhor e não ganham fama nacional ou mesmo local. E esses são tão importantes
quanto os que estão diante da multidão. Tão importante quanto pregar à quase cinco
mil pessoas, foi pregar apenas para uma que se tornou um grande instrumento
para a conversão de muitos.
Também aprendemos que pessoas de visão são
aquelas que enxergam o poder de Deus em tudo e que não limitam a ação de Deus
às circunstâncias. Talvez Deus não o (a) tenha chamado para uma obra de
destaque. Talvez nem você o queira. Mas Deus pode usá-lo para grandes coisas,
sem que você ganhe os louros da vitória. Como André, preocupe-se em levar
pessoas a Jesus, ao invés de preocupar-se em aparecer diante das pessoas a quem
Jesus coloca em sua frente.
Seja missionário de almas e não de multidões. Ore
para que Deus lhe dê este ardor e dedicação para ocupar esta função. Talvez
você não se veja pregando diante da Igreja para dezenas de pessoas, mas pode
levar um amigo ou familiar a conhecer e reconhecer a necessidade que tem de
Jesus. Dificilmente, hoje em dia, encontraremos pessoas que entram na Igreja e
se convertem diretamente por pregações a multidões. Na maioria das vezes as
pessoas vão à igreja por indicação ou convite de amigos e são, por elas,
apresentadas a Jesus. Que tal lançar o desafio de apresentar um de seus amigos
ou familiares ao Senhor do Universo? Que Deus lhe use tanto quanto usou a André
nesse mister. Medite na letra do poeta e torne as palavras deste as suas, clamando
para que participes da “Colheita Bendita[11]” e coloque-se à
disposição do Senhor em Sua seara:
1 Ceifeiros somos nós, fiéis,
Ceifando para o Rei dos reis
Os frutos prontos a colher
Que em derredor se estão a ver.
Assim, a Cristo, o Salvador,
Rendemos preito de louvor,
Ao nosso Mestre lá no céu,
Que sobre a cruz por nós morreu.
Vamos nós
obedecer! Vamos à colheita
Para quando
anoitecer ver a obra feita.
Pouco tempo
restará,
Breve o
prazo acabará;
Breve,
breve, breve acabará!
2 Nós trabalhamos por Jesus
Que para os campos nos conduz
E na seara imensa quer
Obreiros novos receber.
Ainda há muito o que fazer
E tanto fruto que colher!
Não ouves Cristo perguntar:
“Quem quer por mim ir trabalhar?”
3 Estão as horas a fugir;
O teu Senhor não tarda em vir.
Tu queres fruto ao céu levar
Ou folhas só apresentar?
Oh! não demores a atender,
A noite em breve vai descer.
Conosco toma o teu lugar
E por Jesus vem trabalhar!
(C. H. Gabriel – A. Watson)
[1] Extraído e adaptado de MACARTHUR,
John. Doze homens comuns. A experiência
das primeiras pessoas chamadas por Cristo para o discipulado. São Paulo:
Editora Cultura Cristã. 2011, 2ª Ed.
[2]
Leituras complementares: D – Jo 1.35-42 André
é o primeiro a seguir Jesus; S – Jr 1.4-10 Deus escolhe seus servos e os capacita; T – At 1.1-14 André
obedece a ordem de Jesus sem relutar; Q – Lc 5.11 Chamado para ser pescador de homens; Q – 1Co 2.1-5 A simplicidade
da pregação; S – Mt 5.11-12 Bem-aventurança na Perseguição; S – Mt 10.34-39 Quem
perder a vida por Cristo, encontrá-la-á.
[3] Ibid. Pp 69.
[4] Leia-se Iavé
[5] CARSON, D. A.; MOO, Douglas J.;
MORRIS, Leon. Introdução ao Novo
Testamento. São Paulo: Editora Vida Nova, 1997.
[7] MACARTHUR, John. Doze homens comuns. A experiência das
primeiras pessoas chamadas por Cristo para o discipulado. São Paulo: Editora Cultura Cristã.
2011, 2ª Ed. Pp 74.
[8] Doravante denominado de AT
[9] MACARTHUR, John. Doze homens comuns. A experiência das primeiras pessoas chamadas por
Cristo para o discipulado. São Paulo: Editora Cultura Cristã. 2011, 2ª Ed.
Pp 79.
[10] Disponível em: http://www.gotquestions.org/Portugues/morte-apostolos.html.
Acessado em: 24/06/2015
[11] Nº 286 do Hinário Novo Cântico.
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