Um
dos pecados conhecidos como um dos “Sete pecados capitais[1]”,
e que assolam a humanidade desde a sua origem é o pecado do orgulho. Ele é
capaz de destruir a vida das pessoas, seus relacionamentos e põe a perder até
mesmo suas qualidades e conquistas, pois, elas mesmas se supervalorizam em
detrimento das demais, apontando, ou deixando à vista, apenas suas “glórias”
para que as pessoas vejam, de modo que não deixam perceber suas limitações ou,
mesmo que percebam, colocam suas qualidades em tal evidência a ponto de ofuscar
as limitações. Pelo menos é o que desejam.
Em
maior ou menor quantidade, este pecado, também identificado como o pecado da
vaidade, afeta todos os homens. É comum para nós nos orgulharmos das coisas
boas que fazemos, das vitórias que possuímos e, até mesmo, das coisas boas que
pessoas com as quais nos identificamos e gostamos, fazem. Embora haja pessoas
que, assumidamente dirão que não são vaidosas/orgulhosas, todos temos este
pecado entranhado em nós. Afinal, tudo o que fazemos é para o agrado de alguém
(Deus) e, quando não tomamos cuidado, nós é que queremos ser agradados. O
orgulho/vaidade nos ronda (Ec 1.02) e precisamos constantemente lutar contra
ele para não sermos dominado pelo desejo do nosso coração de ocupar um lugar
que não é nosso, e cuidarmos para não fazer tudo para o nosso agrado.
A
bíblia nos incita a lutarmos contra o mal e contra tudo aquilo que pode nos
fazer cair, nos despindo da velha natureza, i.é., velho homem (Ef 4.22; Cl
3.9), que era totalmente inclinado para fazer aquilo que é contrário à vontade
de Deus em nós. Não podemos fazer isso sozinhos. Mas, uma vez que o Espírito
Santo nos habilita para agirmos de acordo com a nossa natureza regenerada em
Cristo, podemos e devemos nos despir de tudo o que é anterior a nossa salvação
no tempo e no espaço[2].
Sendo assim, embora seja difícil para nós lidarmos com qualquer pecado, podemos
vencer o orgulho.
Neste
ponto, podemos fazer a seguinte pergunta: 1)Como
Deus trabalha em nós para vencermos o nosso orgulho? Muitas vezes, não
sabemos como responder a essa pergunta, embora saibamos dar algumas respostas
dentro daquilo que fomos acostumados
a responder, em conformidade com a nossa educação cristã. Mas uma resposta
precisa ser dada por nós para respondermos, a quem quer que seja, sobre essas
questões.
Como
já dito, não somos os únicos a lidarmos com esses problemas e nem a nossa
geração é a única a ser marcada pelo orgulho. As Escrituras nos mostram como
diversos homens do passado lidaram com elas de maneira que suas vidas tomaram
rumos diferentes em suas histórias por causa desse pecado capital. Muitos
homens tiveram de passar pelo tratamento de Deus a fim de se tornarem pessoas
menos orgulhosas e, portanto, mais humildes em suas vidas, mesmo tendo de lidar
com o gosto amargo do sofrimento para que, afinal, pudessem reconhecer a
soberania de Deus e seu senhorio sobre a criação (Ne 9.6).
Um
desses exemplos que demonstram claramente como Deus lida com o nosso orgulho é
o de Naamã. O registro dessa transformação se dá em 2Rs 5.1-15a. Embora outras
lições possam ser extraídos dessa porção das Escrituras, vemos também algumas
das maneiras como Deus lidou com o orgulho desse homem, transformando-o num
homem humilde, de coração grato a YHWH. Vejamos algumas valiosas lições que
este homem aprendeu e de como Deus lidou com o seu orgulho:
1.
Deus
mostra a limitação de Naamã (1-3): Naamã era um homem vaidosíssimo.
O verso 1 do nosso texto nos diz claramente como Naamã era visto e como ele
mesmo se via e se mostrava diante das pessoas. Não sabemos muitos a respeito
desse homem, exceto de que ele era um “herói
de guerra” e que “por ele o SENHOR
dera vitória a Síria” sobre as nações com as quais combatiam. Ele era um
homem temido por seus inimigos e admirado em sua corte. Era um homem
excepcional para sua época e um homem que certamente todos os comandantes de
guerras e reis da época, principalmente dominadores, gostariam de ter em seu
exercito. O problema era que ele se via como um herói da guerra, esquecendo-se
de sua condição como leproso[3].
Embora o texto mostre claramente como ele era visto, uma informação adicional
nos foi dada pelo compilador[i]
dos livros reais que demonstram que suas limitações eram observadas e vistas
mesmo diante da imagem que Naamã transmitia. Ele podia fazer questão de
menosprezar sua lepra em detrimento de seu status
como soldado que era, mas isso não fazia com que sua lepra não fosse vista
pelas pessoas, nem por Deus e nem por ele mesmo. Ele tinha ciência dela. Ele
quis curá-la quando teve oportunidade. A serva de sua esposa, uma israelita
levada como prisioneira percebeu a ponto de falar do profeta da parte de YHWH
que poderia ser instrumento para que a vontade de Deus fosse executada. Mas,
mesmo diante de todas essas coisas, a imagem que ele demonstrava por onde
passava era de um herói. Naamã se orgulhava disso, bem como todos os seus
também. Mas Deus demonstra ciência não apenas do Naamã, herói da guerra, mas
também do Naamã, leproso, que precisava da única coisa que poderia curá-lo na época:
um milagre divino. Enquanto ele se lembrava de suas glórias, Deus demonstrava
sua limitação. Enquanto ele era temido como um homem valente, ele era visto
como leproso. Enquanto ele se orgulhava de suas vitórias e de seu status, Deus
deixava visível sua doença. Deus poderia curá-lo sem a necessidade de seu
reconhecimento quanto à graça de YHWH, assim como o fez quando deu vitórias a
Síria por meio dele. Mas Deus queria destruir o coração orgulhoso de Naamã,
fazendo-o perceber sua real necessidade do Deus Todo-Poderoso, que estava
reinando soberanamente naqueles dias sobre o Seu povo, mesmo que aos olhos do povo
e de Naamã não fosse assim. Deus o faz conviver com sua lepra constantemente,
mesmo a despeito do desejo que Naamã pudesse ter de ser curado de sua doença,
como era o pensamento de qualquer leproso na época. A semelhança dessa ação da
parte de Deus, temos o Apóstolo Paulo com seu espinho na carne (2Co 12.7-10)
que, para não se vangloriar a respeito das visões que tivera (2Co12.1-6),
foi-lhe posto esse espinho na carne e, quando pedia ao SENHOR para tirar, ouvia
como resposta apenas a frase “A minha
graça te basta” (2Co12.9). Naamã podia se envaidecer e se orgulhar de ser
um herói de guerra, mas Deus mostrava claramente a sua limitação.
2.
Deus
faz Naamã se despir de sua arrogância (9-13): Ouvindo Naamã
sobre a existência de um profeta em Israel que poderia curá-lo, ele se dispõe a
ir e arruma tudo o que seria necessário para esta empreitada. Chegando à terra
do profeta, se depara com a seguinte situação: ele, soldado siro, respeitado e
renomado na época, da nação dominadora de Israel, vindo de longe para ter com o
profeta não é recebido pessoalmente pelo profeta, mas recebe apenas um recado
por meio de um dos discípulos do profeta Eliseu. Para Naamã, com todo o seu
orgulho, essa era uma situação constrangedora. O profeta não o recebe
pessoalmente e ainda manda-o banhar-se nas águas do rio Jordão, como meio pelo
qual Deus faria o milagre. Era simples demais para um homem como Naamã e
totalmente desnivelado com a posição que ele exercia. Ele sai frustrado,
deixando sua arrogância dominar seu ser por não ter sido valorizado por ser quem era e por ter feito o que fez: um herói da
guerra. Suas palavras demonstram claramente sua frustração e sua arrogância no
verso 11; “Pensava eu que ele sairia a
ter comigo”. Sua arrogância chega ao ponto de menosprezar aquilo que o
profeta falou-lhe: “Não são, porventura,
Abana e farfar, rios de Damasco, melhores do que todas as águas de Israel? Não
poderia eu lavar-me neles e ficar limpo? E voltou-se e se foi com indignação”
(2Rs 5.12). Toda a tendência pecaminosa de Naamã estava manifesta ali, gritando
por não ter sido tratado como ele achava que deveria e merecia ser. Seu senso
de autossuficiência estava em níveis
alarmantes e era justamente isso que o estava impedindo, naquele momento, de
vislumbrar a grandeza da graça de Deus. Algo precisava mudar e não eram as
palavras ou o comportamento do profeta e sim as palavras e o comportamento de
Naamã que precisavam ser revistos. Ele precisava se despir de sua arrogância
para poder atender à palavra de Deus e poder, por fim, gozar daquilo que
almejava, pois esta era a vontade de Deus
para a vida dele. Um dos oficiais de Naamã, mais crédulo que ele, confronta seu
senhor, de maneira pacífica, com a finalidade de lhe fazer pensar a respeito
das palavras do profeta. Quando o rapaz interpela lembrando Naamã da facilidade
daquilo que lhe fora pedido, parece que a consciência dele é acionada no mesmo
instante e ele se dá conta de que não era nada surreal o que estava sendo
pedido. E Naamã atende a palavra do profeta após a interpelação de seu oficial.
Naamã precisou abandonar toda aquela ira e indignação, bem como toda a
arrogância que o cegava para ver que não estava sendo exigido dele nada além
daquilo que ele poderia fazer. O rapaz argumenta com Naamã dizendo-lhe que se
fosse algo sobremodo difícil, ele o faria. Mas sendo algo simples, por que não
fazer? A resposta talvez seja clara, quando percebemos a arrogância dele: um
homem da condição dele, um soldado valente com um problema tão sério não
poderia ser curado com algo que não estivesse ao seu nível, nem mesmo por algo
que não lhe impusesse dificuldade alguma. Ele precisou ver além de sua
arrogância para que pudesse vencer sua lepra. Somente quando ele se despiu dela
é que foi feito o milagre que ele tanto esperava e que ele queria, quando saiu
da Síria e dirigiu-se até as terras de Israel. Ele precisou não se ver como um herói da guerra, e sim como um leproso para que pudesse entender sua
necessidade e se despir da arrogância.
3.
Deus
faz Naamã se submeter à Sua vontade (14): Ouvidas as
palavras de seu oficial, Naamã resolve submeter-se àquilo que Eliseu havia lhe
dito da parte de Deus. Naamã se submete à vontade e a ordem de Deus de maneira
total, agora não mais importando as circunstâncias externas. Deus já havia
operado em Naamã dando-lhe consciência de sua arrogância e da facilidade
daquilo que estava sendo exigido dele. Deus já havia feito Naamã trocar sua
visão, não vendo-se mais, apenas,
como um herói de guerra, mas como um leproso. O que faltava a Naamã agora era
atender à palavra de Deus com obediência para que pudesse ser curado. É
interessante o fato de que aquele homem que se indignou pelo profeta não ter
ido pessoalmente atender-lhe, ter, agora, mergulhado nas águas sete vezes até
ficar limpo. Sua situação era outra. Agora ele era um leproso em busca de cura
e não um herói querendo banhar-se. Ele mergulhou vez após outra sem ver
resultado até a sexta vez. Para o homem que não queria banhar-se nenhuma vez,
mergulhar seis vezes sem ver o resultado e sem discutir, era resultado duma
ação interna da parte de Deus. Ele foi persistente naquilo que ele queria, mas
mais que isso, ele foi obediente, mesmo não vendo resposta imediata. É
importante notar que, se Deus quisesse curá-lo sem o uso das águas, ele o
faria. Jesus, certa feita, curou dez leprosos apenas pela palavra do Seu poder
(Lc 17.11-17). Deus poderia fazer o mesmo agora com Naamã, mas, como o
propósito era, também, lidar com o orgulho de Naamã, o mergulho era necessário
para fazer com que este guerreiro se submetesse a vontade e a Soberania do
SENHOR dos Exércitos. Deus estava requerendo dele apenas obediência à sua
Palavra, dita por meio do profeta. Ele precisou ser obediente para continuar em
seus mergulhos mesmo não vendo resultado algum até o sexto mergulho. Mas, ao
sétimo, algo aconteceu. Sua carne, segundo o texto, ficou limpa. Aquele homem
viu o resultado, não imediato como ele queria, embora bem imediato comparado a
outras circunstâncias da vida, apenas quando foi obediente até o fim, mesmo sem
ver saída. O homem impaciente com o profeta, agora foi paciente com seus
mergulhos. O homem vaidoso e orgulhoso demais para admitir que o profeta não
lhe deu atenção, mesmo ciente de quem ele era, agora obedeceu sem discutir aos
mergulhos mesmo não percebendo o resultado. O homem que não se submetia e não
atendia aos seus inferiores quando isso não lhe agradava, agora se submeteu a
lavar-se nas águas dantes menosprezadas por ele. A terceira maneira de como
Deus venceu o orgulho de Naamã foi justamente fazendo aquele homem curvar-se diante
de Seu Senhorio e Soberania. Não eram os mergulhos. Não eram as águas. Não era
a fé de Naamã, pois ele não tinha, se não, teria feito logo que lhe foi dito
por Eliseu. Não foram sua determinação e insistência apenas. Era tão somente a
obediência a Deus que iria resolver o problema. Naquele instante um milagre foi
feito, uma cura foi realizada. Mas não era a lepra o maior problema e que
precisava ser curada. O maior milagre e a maior cura foram feitos no coração
daquele homem que, agora, vencera seu orgulho. Esse era o verdadeiro milagre e
propósito do SENHOR com tudo aquilo. Foi preciso submeter-se à vontade de Deus
para, então, Naamã livrar-se de sua doença mais cruel e arrasadora de todas: o
orgulho em seu coração.
4.
Deus
faz Naamã reconhecer a Sua grandeza (15a): A cura já havia
sido feita da lepra que Naamã possuía. Ele já havia tido consciência de sua
realidade e de sua limitação, já havia se despido de sua arrogância e
ignorância e já havia se submetido à vontade de Deus por meio de sua Palavra.
Mas ainda faltava uma ultima lição a ser aprendida por Naamã. Ele precisava
reconhecer a grandeza e suficiência do único Deus: o Deus de Israel. Este era o
resultado direto do tratamento que Deus operara em sua vida. Não havia como
Naamã vencer seu orgulho se não, reconhecendo a grandeza de Deus. Mas não havia
como ele reconhecer plenamente a grandeza de Deus, se não vencendo o seu
orgulho. Este era o último estágio daquilo que Deus fizera. Se a lepra fosse o
grande milagre, Naamã nem precisaria reconhecer a grandeza de Deus naquilo
tudo, como nos dias em que Jesus curou os 10 leprosos (Lc 17.11-17). O texto de
Lucas nos diz que, dos 10, apenas um voltou para agradecer a Jesus pela
cura.Todos foram curados e Jesus não devolveu a lepra para os nove que não retornaram.
Eles foram curados, pois este era o propósito de Deus ao manifestar sua graça comum à todos os homens. O mesmo
poderia ser feito agora, mas o propósito não era apenas a cura da lepra e sim
vencer o ardiloso e orgulhoso coração do soldado siro, Naamã. Naamã termina
essa primeira parte de sua história reconhecendo essa grandeza de Deus a ponto
de dizer que “em toda a terra não há
Deus, senão em Israel”. Seu senso de autossuficiência agora foi trocado e
ele reconhece sua dependência da
grandeza de Deus e reconhece essa grandeza ao admitir saber que não havia Deus
fora dos limites de Israel. Ele não estava limitando Deus a uma tribo, como era
de costume na época, ter deuses tribais. Ele reconhece que apenas Israel
cultuava o único e suficiente Deus e que só em Israel poderia se achar tal
Divindade. Naamã, antes herói da guerra, cheio de si, orgulhoso, agora era um
homem temente, obediente e humilde a ponto de colocar-se como servo e não mais como
um herói, como pode ser observado na continuação do verso 15, quando ele trata
Eliseu como seu senhor e coloca-se na humilde condição de servo do profeta.
Tratamento comum a quem estava pedindo favor, mas não comum para o orgulhoso
soldado Naamã. Ele, agora, não mais orgulhoso de si mesmo, sabendo que o Naamã
leproso fora curado de sua lepra, torna-se um herói da guerra temente ao Deus
Todo-Poderoso. Ele passou pelo tratamento de Deus e foi curado e como prova da
cura de Seu coração orgulhoso, foi reconhecer a grandeza do Deus que o havia
libertado da lepra e do orgulho.
Quando
nos damos conta de que vivemos numa sociedade extremamente orgulhosa e egoísta,
cuja vontade é de demonstrar cada vez mais nossas glórias em detrimento de
nossas derrotas, precisamos nos servir dos exemplos que as Escrituras nos
propõem e aplicar tais lições ao nosso coração. Para vencer este pecado
terrível e que cerca nosso ser desde os primórdios do mundo precisamos passar
pelo mesmo tratamento que Naamã passou e termos os mesmos comportamentos e as
mesmas conclusões as quais ele chegou, mas vendo cada uma delas dentro de nossa
realidade. Vejamos algumas aplicações de tais lições para as nossas vidas:
1.
Precisamos
que Deus constantemente nos mostre nossas limitações:
Há muitas pessoas que, ‘inda hoje, se colocam diante das demais e diante da vida
sem se lembrar das suas limitações. É muito mais prazeroso para nós sermos
vistos como heróis destemidos a sermos vistos como leprosos. Assim como Naamã,
temos ciência das nossas limitações. Mas apenas ter ciência delas não é o
suficiente para nos tornarmos pessoas menos orgulhosas. Ao contrário, muitas
vezes essa ciência nos dá mais subsídios para sermos orgulhosos, pois, na
tentativa de não sermos vistos por aquilo que nos limita, procuramos demonstrar
aquilo que nos prestigia. Precisamos ter uma visão verdadeira e coerente da nossa realidade. Não existem pessoas
perfeitas nesse mundo e precisamos ter ciência disso. Precisamos que Deus nos
mostre nossas limitações e não nos livre do desejo de queremos sobrepujar, ou
mesmo esconder essas limitações com a
finalidade de não demonstrar fraquezas. Aliás, este tem sido um dos pontos
constantemente pregados em nossa sociedade orgulhosa. Aprendemos desde cedo que
não podemos demonstrar fraqueza diante das circunstâncias e não podemos deixar
nossas limitações nos limitar em nada. Embora seja produtivo superar nossos
limites, viver em função de nossas glórias apenas asseveram ainda mais nossa
fraqueza. Enquanto demonstramos nossas conquistas, Deus escancara nossas
limitações de maneira que quanto mais queremos escondê-las, mais elas ficam
perceptíveis. Não podemos nos colocar como heróis, mesmo que sejamos.
Precisamos ter visão de nossas limitações e precisamos que Deus as mostre a nós
constantemente para que saibamos que tudo vem dele, inclusive nossas glórias.
Precisamos orar a letra do cântico, quando diz: “nunca me deixe esquecer que tudo o que tenho, tudo o que sou, o que
vier a ser, vem de ti Senhor[4]”.
2.
Precisamos
que Deus nos faça despir de nossa arrogância: A Semelhança de
Naamã, precisamos nos despir de nossa arrogância. Muitas vezes nós agimos como
o nosso senso autossuficiência e isso nos tem impedido de vermos a realidade
sobre nós. Menosprezamos as coisas que acontecem conosco e menosprezamos as
bênçãos de Deus sobre nossas vidas e, pior, não nos dispomos a servir a Ele e a
atender sua Palavra quando não achamos que ela está a altura daquilo que
imaginamos que somos. Preferimos encarar as situações dentro da nossa ótica e
de acordo com nossa visão da vida a nos submeter-nos aos cuidados e direção de
Deus. É preciso que Deus nos dê forças e nos faça despir da velha natureza,
entranhada em nós, mudando nosso conceito sobre nós mesmos e sobre a vida para
que nós possamos arrancar a arrogância de nosso peito e, com isso, caminharmos
rumo a uma vida sem o orgulho. Não é fácil. De todos os três inimigos que possuímos, o mundo, a carne
e o diabo, nossa carne é a mais difícil de ser vencida pois ela é tudo aquilo
que desejamos e queremos fazer na realidade. A nossa vida é uma luta constante
contra nossos anseios. É por isso que, nas palavras de Paulo, precisamos nos
despir da velha natureza, ou seja, do velho homem, que vivia antes da
regeneração (Ef 4.22; Cl 3.9). Não há espaço para orgulho no coração dos filhos
de Deus e embora em nós, agora, haja a santa semente que nos faze viver
diferentes de outrora (1Pe 1.13-23), lutamos constantemente para que o novo
homem, humilde, semelhante ao Seu Mestre, que deu o maior exemplo de humildade
possível (Jo 13.1-20; Fp 2.5-11), possa ser o que vive em nós. Precisamos
arrancar a arrogância de nós e somente pela graça de Deus é que o faremos.
3.
Precisamos
que Deus nos submeta à sua vontade: Não existe outra forma
de enfrentarmos a realidade de nossas vidas e mudarmos os nossos corações, se
não pela vontade soberana de Deus e o modo como fazemos isso é nos colocando
sob Sua Palavra, obedecendo-A. Esta é a maior dificuldade de todas para nós.
Termos consciência de nossas limitações é menos difícil, assim como nos despir
da arrogância também é menos complicado, do que nos submetermos ao senhorio do
Senhor Jesus, a encarnação da Palavra de Deus, embora este seja o resultado de
nos despirmos da arrogância. Sob tudo em nossa sociedade relativista, em que o
padrão de certo e errado depende, e muito, da ótica que analisamos, nos
submetermos à Palavra de Deus, fonte e origem daquilo que é certo, padrão
absoluto daquilo que é verdadeiro, é ainda mais difícil do que nos dias de
Naamã. Hoje, nós vemos as pessoas supervalorizando os mergulhos, as águas, a
fé, a insistência, o resultado, ao invés de valorizar
a obediência que é o que nos faz vislumbramos os grandiosos milagres da parte
de Deus, embora, saibamos, que nem sempre a vontade de Deus é condizente com a
nossa. A Dele é superior e é por isso que devemos nos submeter à sua vontade
soberana, boa, agradável e perfeita. Para vencermos a orgulho de nossos
corações e caminharmos humildes como Ele requer de nós, é preciso obedecer a
Ele sob qualquer custo. Obediência. Esta é a maneira correta de obtermos vitória
e o verdadeiro milagre sobre nossas limitações. Isso não significa livrarmo-nos
delas. Mas sim, reconhecer nossa real necessidade de Deus, o que nos leva à
quarta lição.
4.
Precisamos
que Deus nos faça reconhecer sua grandeza: Contrariando a
nossa mente autossuficiente, precisamos reconhecer a nossa necessidade de Deus
e reconhecer sua grandeza absoluta sobre todas as coisas. A semelhança de
Naamã, obedecer apenas não é o suficiente sem o reconhecimento sincero da
existência única do verdadeiro Deus. Não pode haver espaço em nosso coração
para outro ser que seja Grande, Suficiente e Senhor sobre a história,
circunstâncias e sobre a nossa vida, exceto o SENHOR dos Exércitos. Precisamos
reconhecer que Deus é o único digno de ser agradado e que Ele sim, é senhor
sobre tudo, inclusive sobre nossas vidas, e não nós, cheios de limitações.
Hoje, vivemos numa época em que Cristo, o Rei da Glória (Sl 24), é tratado como
um mordomo das pessoas que existe apenas para servir e abençoar o Seu povo.
Houve uma inversão de valores muito grande. Queremos, por causa do orgulho,
tomarmos o Seu lugar como Senhor e dar a Ele o nosso lugar como servos, quando,
na verdade, devemos nos acomodar em nosso papel de servos consagrados,
separados, escolhidos por ele para sermos Seu povo eleito (1Pe 2.9). Muitas
vezes, o que tem atrapalhado nossa caminhada é que nós nos vemos como heróis e
tratamos a Deus como sendo o limitado, totalmente dependente de nossos anseios,
desejos e vontades. Precisamos constantemente pedir ao Senhor, Deus de todo o
universo, que nos faça ver e reconhecer sua grandeza e glória, pois só assim, a
partir desse reconhecimento, venceremos o orgulho no limite de nossa
mente/coração.
Tudo
isso que aprendemos aqui só pode ser alcançado a partir de uma intimidade e
comunhão com o Senhor Jesus, sendo pedido a Ele todas essas coisas em oração.
Embora parta dele “tanto o querer como o
efetuar” (Fp 2.13), precisa haver em nós uma disposição para tal, num
segundo momento, e isso só é conseguido através da oração e da comunhão com
Ele. Precisamos ser tomados do mesmo sentimento do poeta ao escrever o hino “Coração Quebrantado[ii]”
do Hinário Novo Cântico, e orar suas palavras, dizendo:
Sonda-me, ó Deus,
pois vês meu coração!
Prova-me, ó Pai,
te peço em oração.
De todo o mal
liberta-me, Senhor,
Até da transgressão que oculta for.
Vem me lavar dos vis pecados meus,
Conforme
prometeste, meu bom Deus.
Faze-me arder e
consumir de amor,
Pois quero te magnificar, Senhor.
Todo o meu ser não considero meu;
Quero gastá-lo
no serviço teu.
Minhas paixões
tu podes dominar,
Pois tu, Senhor, vieste em mim morar.
Lá to alto céu o avivamento vem
E que comece em
mim, seguindo além.
O teu poder, as
bênçãos, teu favor
Concede aos que
são teus, ó Pai de amor.
Amém.
[1]
Sendo eles: 1)Gula; 2)Avareza; 3)Luxuria; 4)Ira; 5)Inveja; 6)Preguiça;
7)Orgulho.
[2]
Embora saibamos que a salvação se deu nos tempos eternos, quando Deus quis, em
Cristo, salvar-nos de nossos pecados, essa salvação se deu no tempo e no espaço
em Cristo na Cruz oferecendo um sacrifício definitivo por nós, mas alcançou-nos
na história no momento de nossa conversão e regeneração por meio da Terceira
Pessoa da Trindade.
[3]
Lembremos que nos dias da monarquia entre o povo de Deus e também depois destes
dias, a condição mais decadente e humilhante de todas era a do leproso. Ele não
era visto como igual entre os seus e era separado dos demais do povo pois
estava marcado com uma terrível doença pra época.
[4]
Diante do trono: Vem de Ti, Senhor
[i] HILL, Andrew E. & WALTON, J. H. Panorama do Antigo Testamento. 2007,
Editora Vida Acadêmica. 2ª Edição. Pp. 247
[ii] ORR, J. E. & KASCHEL, W. (tradução e 4ª
estrofe). Coração Quebrantado. 1999,
Hinário Novo Cântico, Casa Editora Presbiteriana.
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