Os apóstolos do Senhor foram homens
excepcionais. Isso não porque eram pessoas dotadas de características
sobre-humanas, mas sim por serem pessoas demasiadamente comuns, com dúvidas
comuns, com corações comuns – que de tão comuns passam por verdadeiros
incrédulos em alguns momentos – enfrentando problemas comuns e que passaram a
viver uma vida incomum.
Como já visto nos textos anteriores, os
discípulos até aqui estudados foram listados não em suas habilidades e aptidões,
mas os relatos deixavam claro suas imensas fraquezas, evidenciando a
superioridade e supremacia de Jesus. Em todos os relatos dos evangelhos e
também do livro de Atos, a mensagem central foram as palavras e ações de Jesus.
Mesmo em Atos, quando os apóstolos, principalmente Pedro e Paulo, são os
instrumentos de expansão da Igreja, são meros coadjuvantes, afinal, deixavam
bem claro que tudo o que faziam, não era pelo seu próprio “poder ou piedade” (At 3.12), mas sim pelo poder do nome de Cristo
(3.16), em quem “...vivemos, e nos
movemos...” (At 17.28). Desta sorte, não podemos olhar tais homens como se
fossem sobrenaturais. Afinal de contas, todos eles eram homens semelhantes a
nós, ou talvez piores, antes de serem alcançados pela graça de Deus em Cristo e
que foram duramente lapidados e tornaram-se instrumentos poderosos nas mãos do
Criador. Mas não passavam de homens comuns.
Por causa da tradição católica, somos levados
a achar que tais homens eram extremamente iluminados e diferentes de nós
naquilo que fizeram e por causa daquilo que fizeram. Ajuda-nos a entender que o
que fizeram, foi por graça divina, quando lemos:
Os
que alcançam, pela sua obediência, a maior perfeição possível nesta vida estão
longe de exceder as suas obrigações e fazer mais do que Deus requer, e são
deficientes em muitos dos deveres que são obrigados a fazer.[3]
Assim sendo, torna-se evidente o fato de que
não passaram de homens comuns.
Mas o que dizer do último grupo dos
discípulos chamados por Cristo? Já vimos que os doze estão listados em 3 grupos
distintos, levando em consideração a afinidade pessoal que mantinham com Jesus.
Já falamos do mais próximo, formado por Pedro, André, Tiago e João, que sem
dúvidas foram os que mais viram o poder e as realizações de Jesus; falamos de
Filipe, Natanael, Mateus e Tomé, que ocupavam a posição do meio, em relação à
sua afinidade com o Mestre. Mas, agora, falta-nos falar do último grupo, o que,
em relação aos demais, era formado por aqueles que tinham menos afinidade com o
Mestre e que, com exceção de Judas Iscariotes, - que ficou conhecido por trair Jesus
por 30 moedas de prata, - nenhuma informação temos a respeito deles, exceto a
menção de seus nomes nas listas apostólicas. Nenhuma palavra é citada, nenhuma
intervenção ou interação com o grupo é feito, como no caso dos demais. Este é o
grupo formado por pessoas que sempre estiveram à sombra da narração evangélica,
mas que, nem por isso, deixam de deixar sua marca da história da Igreja, sendo
esta o seu maior legado.
1 – A FÉ DESSES HOMENS COMUNS
Embora seja bem verdade que os três que
estudamos agora jamais tenham proferido sequer uma palavra nos relatos dos
evangelistas, isso não significa que foram menores ou inferiores aos demais. Ao
contrário, quando Jesus trouxe repreensão ao grupo, se dirigiu a eles também, e
quando Jesus encorajou o grupo, estava encorajando-os também. Jesus os treinou
durante seu ministério terreno e também foi-lhes prometido os tronos quando da
manifestação da segunda vinda de Cristo. Também foram responsáveis pela
expansão da Igreja e pela ministração do evangelho quando em Jerusalém, e daí
por diante, cumprindo a ordem do Senhor quando da Grande Comissão. Sua fé,
embora silenciosa, foi de suma importância para a propagação do evangelho até
aos dias de hoje.
O relato de João 6, logo após a multiplicação
de pães e peixes pelo Senhor, mostra-nos a firmeza e a força da fé desses
homens. Nos versos 22-65, Jesus deixa claro sua missão e se coloca como o –
verdadeiro – pão da vida. Ele deixa claro que aqueles que quisessem vida em
abundância, deveriam comer de sua carne e beber de seu sangue. Evidentemente que
o salvador não estava incentivando canibalismo ou rituais macabros envolvendo
seu próprio Ser. Mas Ele faz uma menção ao seu sacrifício vicário na Cruz e a
aplicação de Si mesmo à Santa Ceia.
Diante das Palavras de Jesus, a multidão dos
discípulos que estavam ali, ouvindo-O, escandalizaram-se por causa de seu
discurso, a ponto de dizerem que ninguém o poderia suportar (Jo 6.60). Jesus
interpela, agora, apenas os doze, sobre o que fariam. Ele lhes pergunta se eles
também iriam desistir de segui-lo pela dureza do discurso. Pedro, toma a voz e
responde que não havia outro lugar para ir, afinal, apenas Jesus tinha palavras
de vida (6.68-69). Nesse ínterim, Jesus chama Judas Iscariotes de “filho do Diabo”, e o excetua dos demais,
que tiveram suas vozes representadas por Pedro. Tiago, Simão e Judas (Lebeu) eram
homens de fé! Mesmo com a dureza do discurso de Jesus, permaneceram ao Seu
lado, sem se desviarem e sem estremecerem. Enquanto a multidão, perplexa,
deixou-no por não entendê-lo e sem Nele crer, estes ficaram, pois criam no
poder de Deus em Cristo. Não foram,
naquele momento, tardios de coração para crerem. Assim como os demais estavam
dispostos a tomarem do cálice do Senhor até a última gota. Sua bravura foi o
que permitiu que os ensinos apostólicos ficassem perpetuados, também, na
história da Igreja.
Apesar das Escrituras não nos dizerem muito a
respeito deles, eles eram distintos entre si. Vejamos, separadamente, o que
podemos apreender de cada um deles.
2 – TIAGO, FILHO DE ALFEU
A única coisa que as Escrituras nos dizem
sobre este, é o seu nome. Apenas isso nos é dito sobre a sua pessoa nas listas
apostólicas, o que indica que não havia nada nele que requeresse fama ou
notoriedade. Nenhuma palavra, nenhuma pergunta, nenhum comportamento deveras
reprovável. Nem seu nome era único.
Há vários homens identificados como “Tiago”
nos relatos do NT. Temos o Tiago, irmão de João e filho de Zebedeu; Tiago,
filho de Maria e José e, portanto, meio irmão de Jesus, que tornou-se um grande
líder na igreja primitiva, responsável por transmitir a decisão do concílio de
Jerusalém (At 15.13-21) e foi o autor da Epístola que temos nas Escrituras. O
outro Tiago é o “Filho de Alfeu”, discípulo do Senhor.
Um pouco mais de averiguação das Escrituras
nos mostram que a mãe de Tiago se chama Maria. Comparando Mt 27.56 com Mc
15.47, que citam o nome de um homem, chamado José, que era filho dessa mesma
Maria. Sendo assim, Tiago era irmão desse José, que também era conhecido dos
receptores primários, pois seu nome é citado em algumas situações. Lembremos
também que em Mc 2.14, Levi (Mateus, o evangelista e apóstolo), também é
chamado de filho de Alfeu, o que o coloca como um suposto irmão de Tiago. Já em
Mc 15.40, temos a situação de que Maria, mãe de Tiago, estava junto de Maria,
mãe de Jesus, quando da crucificação. Comparando este com Jo 19.25, essa Maria
estava com a mãe de Jesus, sendo identificada como sua irmã e esposa de Clopas.
Com base nisso, inferimos que, talvez, Tiago, filho de Alfeu[4], também fosse primo de
Jesus. Mas isso é tudo o que sabemos sobre sua família.
De modo interessante nenhum dos evangelistas
deixam claro a filiação de Tiago ou seus parentes. Ao que parece, isso não era
uma informação suficientemente importante dentro da história da redenção. Não
importa a sua ascendência, ou descendência. O que importa é o compromisso real,
pessoal e individual em servir ao Mestre.
Em Mc 15.40, Tiago é chamado de “menor”. Essa
palavra vem do grego mikros que pode
significar tanto “pequeno”, ou “de baixa estatura”, como também, em relação ao
filho de Zebedeu, como o “mais novo”. Isso se reforça pelo fato de que, se
fosse mais velho, seria chamado de “Tiago, o mais velho”. Outra importante
referência em seu nome é quanto a influência que exercia. Já vimos
anteriormente que Zebedeu era um homem de influência por ser um importante
pescador na Galiléia. Agora, o filho de Alfeu, não provinha de uma família tão
importante como a do irmão de João. Seu nome, “o menor”, também pode ser uma
inferência quanto à importância de sua família. Isso nos mostra que Tiago, filho
de Alfeu, pode ser o mais baixo, o mais novo e o menos influente em comparação
ao outro Tiago. Mas ele também terá seu nome nas portas da cidade Santa e será
recompensado por sua fidelidade (Mc 10.29-31).
Quanto a sua morte, sua história também pode
ser facilmente confundida com a de Tiago, irmão do Senhor. Mas a tradição mais
antiga nos diz que ele pregou o evangelho na Síria e na Pérsia, sendo morto por
apedrejamento ou ainda crucificado[5].
3 – SIMÃO, O ZELOTE
Embora alguns enxerguem essa expressão “zelote”
como sendo alguém impetuoso e deveras zeloso, não podemos esquecer que “os
zelotes” são uma facção política entre os judeus.
O Judaísmo dividia-se em quatro grandes
grupos: Os saduceus que eram
os liberais em relação a fé e que não acreditavam na ressurreição, nem em anjos
e negavam tudo o que fosse sobrenatural, inclusive milagres no AT; os essênios não aparecem nas
Escrituras, mas eram outro braço do judaísmo. Eles eram celibatários e
extremamente religiosos. Habitavam os desertos e se dedicavam ao estudo da Lei;
os fariseus eram seguidores
inflexíveis da lei e eram fundamentalistas religiosos, cegos por natureza para
crer naquilo que não podiam compreender da Letra da Lei; por fim, os zelotes eram mais voltados à
política e se dedicavam a lutar para se livrar das mãos dos romanos, desejando
e lutando pela liberdade civil e pela restauração civil do reino de Israel[6].
Diferentes dos fariseus que eram movidos por
conveniência, os zelotes eram rigorosos no cumprimento das leis sem abrir mão
de nada, sendo assim, vistos como militantes, violentos e fora-da-lei[7].
Em Mateus e Marcos, quando estes relatam os
nomes dos dozes, eles listam o nome de Simão, o zelote, imediatamente
precedendo o de Judas, o Iscariotes. Inacreditavelmente, os dois tinham
ambições escusas ao se dirigirem a Jesus. Mas em algum momento da caminhada,
Simão, o zelote, violento e fora-da-lei, tornou-se um pregador do evangelho e
abandonou seus maus caminhos. O que Judas, o Iscariotes, não o fez.
Passando a vida em busca de libertação dentro
de Israel, morreu, levando as boas-novas, fora de Israel, como mártir. A
Tradição diz que ele foi para o norte e pregou o evangelho nas Ilhas
britânicas, logo após a revolta judaica, no ano 70 d.C.
4 – JUDAS, NÃO O ISCARIOTES
Judas, o terceiro do ultimo grupo, foi um
homem conhecido por ter três nomes. Seu nome era Judas Lebeu Tadeu. Ele foi um
homem extremamente comum até em seu nome. O nome Judas era um nome comum, tanto
que entre os doze, dois tinham esse mesmo nome. Já os nomes “Lebeu” e “Tadeu”
eram apelidos recebidos por suas características.
“Tadeu” significa “criança de peito”, também
usado para expressar alguém mimado, “queridinho da mamãe”. Já “Lebeu” tem um
significado semelhante, advindo do hebraico, que quer dizer “criança do
coração”. Ambos significam que ele era um homem de um coração terno, semelhante
ao de uma criança.
A única menção das palavras de Judas Tadeu
foi em Jo 14.21-22, questionando Jesus sobre manifestar-se apenas aos doze.
Para ele, que amava ao Senhor, e que estava contemplando as grandezas do Seu
poder, era impossível compreender que Cristo apenas se manifestasse a um grupo
pequeno. Por isso, sua pergunta sincera e humilde, recebe uma resposta branda
do Senhor em Jo 14.23. Ele veria o manifestar-se de Cristo no mundo, na vida
daqueles a quem o Pai O confiou e em quem Ele habitar.
Depois do pentecostes, seguiu para a região
da Mesopotâmia, onde pregou o evangelho e “curou” o rei de Edessa, chamado
Abgar. Fora morto por uma clava – que ficou conhecido como seu símbolo
apostólico – ao ser espancado, até expirar, por sua fé em Jesus. Alguém de
coração terno e, talvez, mimado, foi usado pelo Senhor e entregou seu simples
coração à uma fé vigorosa que o levou a morte, onde, então, pôde encontrar-se
com Jesus.
CONCLUSÃO
Esses três apóstolos pouco são conhecidos ou
mencionados. Talvez nem se saiba de cor seus nomes. Com exceção de Judas, autor
da carta que leva seu nome, nenhum deles teve um destaque maior. Suas palavras
não foram de todas conhecidas pela igreja. Mas, apesar disso, seus testemunhos
foram pilares onde Cristo construiu e mantém sua Igreja. Podemos desconhecê-los
aqui. Mas nos céus, serão lembrados como aqueles que entregaram suas vidas pelo
Salvador.
APLICAÇÃO
É possível ser um grandioso instrumento de
Deus e não receber destaque algum nessa vida. Em dias como os nossos em que as
pessoas estão cada vez mais vaidosas e querem aparecer cada vez mais, lembrar
que o Senhor pode usar aqueles que estão à sombra, ajuda-nos a entender o
verdadeiro caráter daqueles a quem Ele chama.
Você pode ser alguém sem tanta influência na
comunidade ou na Igreja, como Tiago, o menor. Você pode ter tido um passado
vergonhoso, como Simão, o Zelote. Você pode ser mimado e, por vezes, simples e
ingênuo como Judas Lebeu Tadeu. Todas essas pessoas poderão ser usadas pelo
Senhor se colocarem-se como instrumentos em suas mãos. Ore pedindo ao Senhor
que o use independente de quem tu eras ou é. Mude seus caminhos, converta-se
verdadeiramente ao Senhor, abandone seus erros (se ainda não o abandonou) e
sirva-O. Seja sincero e confesse a todos a transformação[8]
que o Senhor promoveu em sua vida!
1
Eu, perdido pecador,
Longe
do meu Jesus
Me encontrava,
sem vigor,
A perecer
sem luz.
Meu estado
Cristo viu,
Dando-me
sua mão,
E salvar-me
conseguiu
Da perdição.
Cristo me amou e me livrou!
O seu imenso amor me transformou!
Foi seu poder, o seu querer!
Sim,
Cristo, o Salvador, me transformou!
2
Minha vida, todo o ser,
Quero
lhe consagrar!
Ao seu
lado vou vier,
O seu
amor cantar.
A mensagem
transmitir
Aos que
perdidos são!
Venham
todos já fruir
A salvação!
(J. Rowe – S. L.
Ginsburg)
[1] Adaptado de MACARTHUR, John. Doze homens comuns. A experiência das
primeiras pessoas chamadas por Cristo para o discipulado. São Paulo:
Editora Cultura Cristã. 2011, 2ª Ed. 192 p.
[2] Leitura recomendada:
Para ler e meditar durante a semana
D – Sl 131.1-3 Seja humilde; S – Gl 5.16-24 Aprenda com o Espírito; T – Jr 1.1-7 Deixe-se
usar por Deus; Q – Tg 4.6-10 Deus não suporta os soberbos; Q – Gl 5.27 Ande
no Espírito; S – Gl
6.14-17 Glorie-se em Cristo!;S – At 4.23-31 - Deus, nos use!.
[4] Aqui precisamos entender que Clopas e
Alfeu ou eram a mesma pessoa, ou Alfeu veio a falecer e Clopas cumpriu com a
lei do levirato, casando-se com ela.
[5]MACARTHUR, John. Doze homens comuns. A experiência das primeiras pessoas chamadas por
Cristo para o discipulado. São Paulo: Editora Cultura Cristã. 2011, 2ª Ed.
Pp 166.
[6] Ibid. Pp. 167
[7] Ibid. Pp. 168
[8] Nº
336 do Hinário Novo Cântico
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